Depois da ansiedade da preparação para o parto, do esforço de dar à luz, de ficar internada num hospital – que, por mais agradável que seja, é um ambiente estranho e causador de stress - chega o momento em que a recém-mamã leva o seu filho para casa. Nessa fase, a mãe estará a precisar de um descanso profundo para recuperar física e psicologicamente de tudo aquilo por que passou. Mas o que ela vai encontrar é precisamente o oposto: é o bebé que chora, o sono que fica cortado pelo amamentar de duas em duas horas, o ficar em casa sozinha com o bebé enquanto o pai e a restante família vão às suas vidas…
A criança torna-se o centro de todas as atenções, toda a vida da mulher passa a ser ditada pelas necessidades do pequeno indivíduo. Acabam as saídas com as amigas, as idas às compras ou ao café. E, ainda por cima, quando se olha ao espelho, a mulher não se reconhece na imagem que vê reflectida, tal a distorção provocada pelas alterações hormonais e pelo peso ganho durante a gravidez.
Por tudo isto, não é de estranhar que a chegada de um bebé a casa tenha um impacto negativo no estado psicológico da mãe. A ideia arreigada na sociedade de que a mulher deve estar radiante com o nascimento do seu bebé contribui para a fazer sentir ainda pior: um defeito ou imperfeição no seu carácter impede-a de desenvolver os sentimentos naturais nestas circunstâncias, acha ela. E isso, por seu turno, pode levá-la a esconder estes sentimentos ambivalentes dela própria e dos outros. Sem partilha de emoções, estas mulheres correm um maior risco de só serem diagnosticadas quando a situação já é muito grave.
Estima-se que mais de 80% das mulheres que dão à luz sofram do chamado “baby blues”. Trata-se de um conjunto de sintomas que aparecem geralmente entre o 3º e o 10º dia do pós-parto e que consistem em alterações de humor, com tristeza ou irritabilidade, e insegurança perante a nova responsabilidade de cuidar do bebé.
“As mulheres afectadas por blues carecem de vigilância, atenção e de supor¬te pelos profissionais de enfer¬magem, que deverão, inclusive, informar as parturientes e suas famílias da forte possibilida¬de de ocorrência de alterações emocionais transitórias nos dias subsequentes”, alerta Ricardo Gusmão, professor de psiquiatria na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, num artigo sobre o tema escrito para o “Jornal do Centro”.
Contudo, enquanto o baby blues pode ter como factor de precipitação as explosões hormonais que ocorrem nessa fase e que passarão com o tempo, a depressão pós-parto é bem mais grave. Nesta, aos sintomas de blues aliam-se a outros, como uma desmotivação nos cuidados de si mesma e do bebé, que podem colocar a mãe e o filho em risco.
Estima-se que, em Portugal, 13 a 16 em cada 100 mães de bebés com menos de 1 ano sofram da doença. “As mães e as famílias não percebem muito frequentemente que não há culpados nesta situação e que se trata tão-somente de mais uma doença”, refere o psiquiatra.
Caso não seja tratada, a depressão pode persistir durante décadas, podendo ou não ser acompanhada de rotura afectivo-sexual conjugal e comprometer o desenvolvimento normal da criança: ela pode conduzir àquilo que o especialista denomina de “espiral depressiva transgeracional”. Isto significa que, ao serem privadas de “ ‘nutrientes’ afectivos básicos desde muito cedo, têm uma maior probabilidade à depressividade na adolescência e vida adulta.”
De acordo com a literatura médica, existem alguns factores de risco associados a esta patologia: sofrer de tensão pré-menstrual, de sintomas depressivos durante a gravidez, ter um historial clínico de distúrbios afectivos e problemas de saúde durante a gravidez e parto.
Mas um estudo publicado este mês na revista “Pediatrics” vem acrescentar mais dois factores de risco: viver numa grande cidade e ter pouco poder financeiro. Segundo os investigadores da University of Rochester Medical Center, dos EUA, 56% das mulheres avaliadas - 198 mães de bebés com menos de 14 meses - sofriam de depressão pós-parto e tinham em comum esses dois factores. Sim, de facto, estas duas situações podem condicionar a vida já de si complicada destas mães, dado que muitas estão longe dos seus familiares mais próximos, não podendo contar com o seu auxílio para a realização de muitas tarefas, o que lhes permitiria ter um pouco mais de tempo para si. Por outro lado, a falta de dinheiro impede-as de contratar uma babysitter, de encomendar comida de fora, de arranjar uma empregada para fazer limpezas...
Além do tratamento medicamentoso, da psicoterapia e da ajuda da família e dos amigos, alguns especialistas também defendem que cada país deveria criar redes de convivência em que as jovens mães pudessem partilhar as experiências com outras mulheres, muito à semelhança do que timidamente já começa a acontecer no nosso país com as doulas (mulheres que já tiveram filhos e que dão apoio prático na preparação para o parto).
O importante em todo este processo é partilhar angústias, medos e ansiedades com outros, de modo a exorcizar os sentimentos experienciados nestas situações e a devolver à mulher a alegria de ter um filho nos braços.
As informações acima foram retiradas do site http://portal.alert-online.com/revista/?key=680B3D50093A6A2125590E2032232A5206343E002E71023A360727130E2A6A5F73015F